O Castelo - Dois Mundos Em Conflito

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Os Egos e o Ser Consciente


O ego que busca tranquilizar-se pela alimentação (gastrimargia, gula), pela acumulação de bens (philarguria, avareza) ou de prazeres (porneia, luxúria). O ego que se revolta quando se está em desacordo com ele (orgé, ira).
O ego que se entristece quando lhe falta alguma coisa e quando a realidade não corresponde a seu desejo (lupé, tristeza, inveja).
O ego que desespera (acedia, preguiça) e delira para tranquilizar-se, que inventa para si uma autonomia e um poder que não possui (kenodoxia, urephrania, vaidade, orgulho).
Será que a doença mental não estaria enraizada na afirmação do ego, em detrimento do Si mesmo Transpessoal que o habita?
Os monges querem substituir a atitude "egocêntrica" do ser humano patológico pela atitude cristocêntrica ou teocêntrica do ser humano sem patologias (apatheia).
Diríamos hoje que a psicologia transpessoal pretende substituir a atitude neurótica do ser humano açulado pelas representações que tem de si mesmo pela atitude aberta, não egocêntrica, que o tornará aberto às aventuras inspiradas pela Consciência e pela Vida.
“Não sou só eu que vivo com minhas memórias, minhas necessidades, minhas carências, é também a Grande Vida que vive em mim com sua plenitude, sua generosidade."
Quando não somos egocêntricos não somos mais escravos do "eu-meu" infantil que quer constantemente ser o centro do mundo e sofre quando este lugar lhe é recusado.
Então a pessoa se torna capaz de amar e de servir, sem nada esperar em troca, gratuitamente (de graça).
Não é esta a atitude "natural”, não patológica, do adulto diante de seus próprios filhos?
É verdade que bem poucos hoje atingem esta "maturidade”. Conhecemos muitos desses "adultos" que têm três ou quatro anos de idade e que, na hora de aposentar-se, reclamam ainda a honra e a atenção que lhes são "devidas" e que certamente lhes faltaram em sua infância. Alguns chegaram até a "idade da razão”, poucos a ultrapassaram.
Como dizia Bernanos “a graça é esquecer-se”, não mais perceber-se a si mesmo... Este "esquecimento de si” não é o resultado de um voluntarismo qualquer, mas o fruto de uma experiência do Tanspessoal no meio do cotidiano.
Não mais ver as coisas em relação a si mesmo restitui cada coisa à claridade de sua evidência. Isto não nos “exila” do mundo, ao contrário, estamos exatamente no mundo, mas permanecemos livres a seu respeito e o tornamos livres a nosso respeito:” no mundo, mas não deste mundo”.
O estado de apatheia que traduzimos por um “estado não patológico do ser humano" é um estado de espontaneidade, de inocência, de simplicidade (simplicitas, etimologicamente que dizer "sem dobra”, sem dobrar-se sobre si mesmo).
É um estado de claridade da inteligência que "vê" as coisas como elas são, sem projetar-se nelas com suas memórias, suas idéias, suas ideologias (ídolos ) . É a consciência-espelho, estado de calma e de saúde do cérebro, dirão os neurofisiólogos.
A apatheia significa também um estado de pureza do coração, capacidade de amar, sejam quais forem as circunstâncias; é o "amor aos inimigos”, de que fala Cristo, isto é, o acesso a uma dimensão do amor que não depende de circunstâncias ou de encontros favoráveis para manifestar-se. É o Amor-Ser, o Núcleo indestrutível "que faz girar a Terra, o coração humano e os outros astros.
"É aquele Sol que faz sua luz brilhar tanto sobre os maus como sobre os bons”, de que nos fala o Evangelho (Mt 5, 43-46).
Enfim, este estado de apatheia é um estado de luminosidade e de leveza do próprio corpo físico.
A Transparência às energias divinas, como o mostra São Serafim de Sarov e muitos outros santos, dá ao corpo carnal as qualidades de um corpo de luz ou de um "corpo de ressurreição". (cf. ”grande tema da Transfiguração e Ressurreição da carne no cristianismo: a possibilidade de uma participação real de nosso ser espácio-temporal na vida divina)."
 Jean-Yves Leloup, páginas 74, 75,76, Escritos sobre o HESICASMO, Editora Vozes.

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